quarta-feira, 26 de março de 2008

A solidão dos vizinhos

Algures a caminho de Sintra, entre Lisboa e Rio de Mouro, moram os meus vizinhos. Durante três dias seguidos a contar do Domingo de Páscoa, da minha janela, por duas a três horas de cada vez, observei e registei os seus movimentos. Escassas décimas de segundo de vidas, que só por si nada nos dizem mas, na sua unidade, expressam como passámos do “viver com”, para apenas vivermos “perto de”.
Eles e elas, em passo apressado ou tranquilo, passaram junto ao meu prédio, normalmente sozinhos, às vezes, poucas, em família. Vizinhos com vizinhos nunca assisti, excepto as crianças, que aproveitando a pausa escolar brincavam juntas e com tempo para si e para os seus amigos. Os meus pares (chamam-se adultos) quando se cruzavam não paravam, raramente um bom dia, apenas um olhar rápido, às vezes. Vidas adjacentes que se ignoram.
No meu bairro o espaço público revela-se apenas um sítio de passagem, corredores que nos levam ou trazem do supermercado, para ou do trabalho, ou um simples passeio ao centro comercial, por exemplo. No subúrbio onde moro há vizinhos, mas não há vizinhança, há pessoas mas não se conhecem, há um território comum onde se vive só.
No bairro onde vivo tenho saudades do bairro onde nasci, um lugar onde o meu passo era permanentemente interrompido por um vizinho que me interceptava para um “bom dia, como vais?”, “tomas qualquer coisa?”, “como vai o teu pai?”, “já resolveste o problema do teu emprego?”. No bairro onde nasci havia vizinhos.
(desculpem a imensidão do texto)
João Vasco

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